KARL POPPER NÃO ERA UM MATERIALISTA
Por ANTONIO MIRANDA
Karl R. Popper não era — como muitos o consideraram, um materialista, um positivista. Ele mesmo se defendeu destas acusações, em conferência e entrevistas memoráveis. Não vamos chamá-lo de “neo-positivista” porque tudo o que rotulamos com “neo” pretende transcender o estado anterior, que não estava em sua trajetória de pensador.
Não era um materialista porque não reduzia a realidade às coisas materiais. “Tampouco sou positivista, porque considero moralmente errado não crer na realidade e na infinita importância do sofrimento humano e animal, nem na realidade e importância da esperança humana e da bondade humana.”[p. 19]
O criador da Teoria do Conhecimento Objetivo e o formulador da tese dos 3 mundos (material, metafísico e o universo de valores e objetos criados pela cultura humana, os três interdependente.
O terceiro mundo (*1) sendo a chave para a compreensão dos três mundos.
É complicado aceitar uma teoria que mescla o material e o imaterial, que reconhece a ideia e sua materialização. Que está dentro e for do indivíduo. Uma teoria que ao mesmo tempo inclui a materialização e a abstração. Popper, tardiamente, quase na contramão de suas conivicções iniciais, concebe e admite um lado “abstrato” do mundo 3, na explicação da relação necessária entre os mundos 1 (físico) e 2 (metafísico), que cria a realidade e refuta o infinitum.
As leituras dos primeiros textos de sua Teoria do Conhecimento Objetivo pareciam explica que o “mundo 3”, mesmo gerado no mundo 2 em sua relação /reação ao mundo 1, seria um mundo autônomo, em certo sentido externo ao homem, por isso capaz de comunicar e trocar experiências com outros indivíduos, servindo como filtro ou modelo para o entendimento do(s) mundo(s). Isso, sem restringir-se à fenomenologia na media em que não fica na relação entre os mundos 2 e 1, ao construir os mecanismos de “conjecturas e refutações destas relações”; e sem ficar no idealismo, na crença de uma Gestalt primeva, reconhecível do mundo. Haveria, sim uma “descoberta” do mundo, mas também, e paradoxalmente, uma “invenção” do mundo, ao mesmo tempo. Não haveria nenhuma certeza em dúvida (pela falsificação) — pela permanente “formação da realidade pelo conhecimento”, mediante o “saber conjectural”, pelo método crítico.
Essa concepção dualista do conhecimento objetivo — ser e estar ao mesmo tempo — é a base da ciência da documentação ou da ciência da informação.
[Texto originalmente escrito em um caderno de viagem em 2008.]
(*1) “mundo dos produtos objetivos do espírito humano” — engloba coisas materiais (ex. em livros, sapatos, etc.) como imateriais (teorias, pressupostos”). Uma visão antropocêntrica.
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